Fuga
- carolinapessoajorn
- 25 de mar. de 2023
- 2 min de leitura

A mão apertada contra o meu pescoço esmagava-me. Meu fôlego ia diminuindo e uma sensação de pânico tomava conta da minha mente.
Aquele relacionamento abusivo já durava anos. Por inúmeras vezes apanhei, mas nunca tive coragem de denunciá-lo.
Agressões verbais, pressões psicológicas, socos, tapas…
Passei pelo inferno nas mãos daquele homem.
Mas ainda assim eu persistia, persistia.
Sempre alegando ser a família, os filhos, a estabilidade… Ou que ele só estava passando por uma fase difícil e ia mudar.
Até aquele momento.
O soco na mesa na frente da criança demonstrou que dessa vez o transtorno poderia ser pior.
– Essa comida está um nojo – ele berrou em seguida.
Já preparada para catar os restos no chão, senti sua mão apertar meu pulso. Tentei gritar, mas com a outra ele segurou a minha boca. E jogou-me contra a parede, lançando na sequência suas patas no meu pescoço.
Tentei me debater.
Em vão.
Vi de canto de olho o pequeno perdido, chorando, com seu carrinho de brinquedo na mão.
Precisava sobreviver. Nem que fosse por ele.
Uma criança inocente não poderia continuar viva nas mãos desse monstro. Ele já era uma ameaça para mim, quanto mais para ele, um ser indefeso. O menino não tinha culpa.
Então, quando já estava quase perdendo a consciência, vi uma tesoura em cima do móvel. Era só esticar rápido o braço e atacá-lo, apenas o suficiente para paralisar
aquele inferno e conseguirmos fugir.
Mas precisava ser um movimento rápido e certeiro, sem segunda chance.
Meu filho grita, parece entender meu pensamento. E em um milésimo de segundo, o monstro se distrai. Não penso duas vezes: pego a tesoura e enfio forte. O sangue escorre pelo carpete.
(((Silêncio. Nunca mais precisamos entrar naquela casa, marcada pela dor, e pelo medo)))
***
Texto publicado pela escritora e jornalista Carolina Pessôa na 12ª edição da Revista La Loba, sobre violência contra a mulher. Acesse em: https://drive.google.com/file/d/1BptwzvWL0_Mw8wieV9G-npK7YJgqpNl2/view
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